A saúde começa pela boca

Cuidar da higiene bucal vai muito além de manter um sorriso bonito

 

Muitas pessoas enxergam a higiene bucal como uma questão estética ou relacionada apenas à prevenção de cáries, tártaro e mau hálito. No entanto, os cuidados com a boca devem ir muito além disso, uma vez que desempenham papel essencial na saúde física como um todo, inclusive na proteção do sistema cardiovascular.

 

O que acontece na boca pode afetar o coração

O fato é que a boca é uma porta de entrada para bactérias causadoras de várias doenças. Sem a higiene necessária esses microrganismos podem causar infecções, agravar lesões e, em casos mais graves, chegar a corrente sanguínea, atingindo diferentes órgãos.

 

Para dar uma noção da importância dessa correta higienização, nossa boca contém cerca de 50 bilhões de bactérias de, pelo menos, 700 espécies – a maioria delas convive com a gente beneficamente. Quando misturadas aos restos de alimentos, contudo, elas formam uma placa bacteriana sobre os dentes que precisa ser removida diariamente. Caso isso não seja feito por meio da escovação e do uso de fio dental, a placa calcifica, criando o tártaro.

 

Uma má higiene bucal leva, portanto, ao acúmulo de placas bacterianas nos dentes e gengivas, que, ao longo do tempo, tem como possível consequência o surgimento cáries e doenças, a exemplo da gengivite (inflamação das gengivas) e periodontite (infecção bacteriana dos tecidos, ligamentos e ossos que envolvem e sustentam os dentes). Condições que, se não devidamente tratadas, permitem que as bactérias presentes na cavidade oral entrem na circulação. E é aqui que saúde cardíaca começa a correr perigo.

 

Riscos ao sistema cardiovascular

Uma vez na circulação sanguínea, esses microrganismos podem viajar pelo corpo inteiro e causar uma série de danos. Elas aderem a qualquer área lesionada e são capazes de desencadear reações inflamatórias que afetam o coração. Estudos apontam que a presença de bactérias orais no sangue está associada diversas questões que envolvem o órgão. A seguir veremos alguns exemplos.

 

– Endocardite bacteriana

Infecção grave no revestimento interno do coração (endocárdio), causada por bactérias que, como explicado, chegam ao coração pela corrente sanguínea. Essa condição é mais comum em pessoas com válvulas cardíacas danificadas ou dispositivos cardíacos implantados.

 

As estimativas apontam que de 1 a 8 casos de endocardite infecciosa surgem devido a tratamentos odontológicos de pacientes cardiopatas – por já apresentarem uma disfunção no órgão, a probabilidade da doença é maior.

 

– Doença arterial coronariana

Uma inflamação gerada por bactérias orais pode contribuir também para o desenvolvimento de placas nas artérias coronárias (artérias responsáveis por irrigar o coração), aumentando o risco de aterosclerose (acúmulo de placas de gordura e outros elementos na parede dos vasos sanguíneos).

 

É possível ainda que essa inflamação contribua para a redução do calibre desses vasos e, por consequência, do fluxo de sangue. Cenário que pode levar a eventos cardíacos graves, como o infarto do miocárdio.

 

– Acidente vascular cerebral (AVC)

Assim como no caso das coronárias, a inflamação favorece a formação de coágulos e o entupimento de artérias que levam o sangue ao cérebro, desencadeando um acidente vascular cerebral – popularmente chamado de derrame. O AVC acontece justamente quando o fluxo sanguíneo para uma parte do cérebro é interrompido, acarretando em danos ao tecido cerebral devido à falta de oxigênio.

 

E a ocorrência do acidente vascular cerebral pode colocar o coração em risco. Isso porque o sistema cardiovascular está todo interconectado, e muitas das condições que causam um AVC também afetam o coração, entre elas a aterosclerose. Além disso, durante um AVC, especialmente os graves, o corpo passa por um estado de estresse agudo, liberando hormônios (como adrenalina), que podem sobrecarregar o órgão.

 

Saúde bucal e diabetes

Vale ressaltar ainda que algumas doenças que tem relação com a saúde cardíaca têm sintomas que se manifestam na boca. A gengivite persistente pode, por exemplo, indicar questões hepáticas ou renais, como a diabetes. Alterações na cavidade oral, como manchas brancas, úlceras indolores, palidez da mucosa e sangramento gengival espontâneo são alguns dos possíveis sinais.

 

Pesquisa

Um estudo publicado na Revista Científica da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp) aponta que pessoas com questões periodontais tendem a ter um maior agravamento de condições cardiovasculares e menor sobrevida. Segundo o texto, cáries, periodontite, inflamações graves na gengiva, infecções na polpa e tecidos ao redor da raiz do dente estão vinculadas às ocorrências cardiológicas.

 

Além disso, o levantamento revela que casos de periodontites severas podem impactar negativamente quadros de hipertensão arterial sistêmica, diabetes, arteriosclerose e nos níveis de colesterol total e LDL. A meta-análise teve como base 2.499 pesquisas que traçam essa ligação da boca com o coração.

 

A importância dos cuidados

E não estamos falando aqui de casos isolados. Estimativas do Instituto do Coração (Incor) apontam que 45% das doenças cardiovasculares e 36% das mortes por problemas cardíacos têm origem na boca.

 

Por isso, ao notar, particularmente por períodos mais prolongados, a gengiva vermelha, inchada ou dolorida ao toque, sangramentos ocorrendo ao comer, escovar os dentes ou usar o fio dental, mau hálito frequente ou gosto ruim na boca, aumento de sensibilidade e retração gengival ou ainda algum dente com mobilidade, busque a avaliação de um profissional.

 

No caso da endocardite, o quadro desencadeia sintomas semelhantes aos de outras doenças cardíacas, como febre, arritmias, inchaço nos pés, pernas e abdômen, fadiga, sensação de cansaço extremo, dor no peito, nos músculos e nas articulações. Ao perceber qualquer um desses sinais, a recomendação é procurar um especialista para a realização de exames e o possível diagnóstico.

 

Os cuidados com saúde bucal precisam estar incorporados à rotina. É fundamental escovar os dentes ao menos três vezes ao dia, após as refeições, utilizar o fio dental diariamente e fazer um checkup odontológico regular – de acordo com a recomendação do seu dentista.