O frio aumenta as chances de sofrer um infarto?

O frio aumenta as chances de sofrer um infarto?

Quem tem alguma doença cardiovascular deve redobrar os cuidados no inverno

 

De modo geral, a resposta para a questão acima é sim! Estimativas apontam que a chegada do inverno costuma aumentar em cerca de 30% o risco de um infarto do miocárdio. Entretanto, a pergunta envolve uma discussão complexa e multifacetada.

 

Assim, embora muitos afirmem que o frio intenso seja responsável por desencadear complicações cardiovasculares, como a angina, a insuficiência cardíaca e o infarto, a relação entre as temperaturas baixas e os problemas ligados à saúde do coração não é tão direta e simples. Baixas temperaturas podem de fato elevar potencialmente as chances de eventos cardiológicos, porém, isso ocorre em determinadas circunstâncias e por certos fatores.

 

Isso só acontece em baixíssimas temperaturas?

E se você imagina que estamos falando apenas de países em que o inverno é mais rigoroso, com termômetros que chegam a marcar abaixo de zero, se engana. Temperaturas menores que 15 graus já servem como um sinal de alerta.

 

Além disso, a queda brusca da temperatura ou a mudança de um ambiente aquecido para um muito frio também são perigosos. O choque térmico é, portanto, outro aspecto que pode ser o estopim de algum evento cardíaco.

 

O sobe e desce do termômetro

Por isso, é importante começarmos a falar do assunto trazendo o tema para a nossa realidade. No Brasil, em muitas cidades, o termômetro tende a variar bastante no decorrer do inverno e até mesmo ao longo de um único dia.

 

Quem, assim como eu, vive na capital paulista sabe como é: com certa frequência temos o dia iniciando com manhãs frias e, próximo ao horário do almoço, o clima já está mais ameno, principalmente quando o sol aparece. Porém, basta ele se pôr para que a temperatura volte a cair com o passar das horas e a madrugada ganhe um ar gelado.

 

O fato é que o corpo está preparado para lidar com essas variações. Toda vez que precisa se adaptar, aciona um sistema chamado homeostase e diferentes órgãos agem em conjunto para manter tudo em pleno funcionamento.

 

Em resumo, quando saímos de altas para baixas temperaturas, o organismo direciona o sangue quente para os órgãos na intenção de preservar as funções vitais. O coração tende a bater mais devagar, fazendo a respiração acelerar para aumentar a oxigenação do sangue. Os pelos se arrepiam, criando uma camada de ar que funciona como isolante térmico e diminui a perda de calor para o ambiente. No entanto, apesar de o corpo ter seus métodos, os riscos existem e devem ser considerados.

 

Se o corpo sabe como agir, onde está o perigo?

Quando permanecemos em temperaturas baixas e sem o devido aquecimento, o metabolismo precisa se manter acelerado para promover o equilíbrio térmico, sobrecarregando o sistema cardiovascular – cenário preocupante, em particular, para pessoas com condições cardíacas pré-existentes, como doença arterial coronariana. Para quem já tem o órgão debilitado, a exigência de um “trabalho extra” é capaz de desencadear ou agravar o problema.

 

Alertas

O frio extremo provoca a vasoconstrição, isto é, o estreitamento dos vasos sanguíneos (nesse caso, das artérias coronárias, vasos que irrigam o coração). Se as coronárias tem seu calibre reduzido, a quantidade de sangue para o órgão fica menor. Essa diminuição da irrigação do músculo cardíaco e da oferta de oxigênio pode provocar a dor no peito (a chamada angina), um possível indício de isquemia miocárdica ou então do próprio infarto.

 

Nas baixas temperaturas, o aumento da pressão sanguínea sobre a parede dos vasos que já estão estreitos, além de uma sobrecarga cardíaca, facilita o desprendimento de placas de gordura localizadas no interior das artérias, que podem bloquear o fluxo do sangue para o coração e para o cérebro, desencadeando, respectivamente, o AVC (acidente vascular cerebral) e o infarto do miocárdio (ataque cardíaco).

 

Além disso, como sentem menos sede no frio, de modo geral, as pessoas acabam ingerindo menos líquido e consequentemente desidratam. Sangue mais denso e viscoso coagula com mais facilidade, o que também colabora para o aumento da pressão sanguínea.

 

Se o frio for mais intenso e a temperatura corporal baixar para menos de 35ºC, é possível surgir sintomas como cansaço, apatia e dificuldade de coordenação motora. Em casos mais preocupantes, se chegar aos 30ºC, a frequência cardíaca diminui muito e a pouca oxigenação no cérebro dificulta o raciocínio. Há então uma redução do metabolismo, levando ao enfraquecimento do músculo cardíaco e a parada do coração. São casos de hipotermia, considerada a situação mais grave resultante do frio extremo.

 

Além da queda da temperatura…

Vale reforçar que o inverno no Brasil não significa apenas frio, mas também clima seco e aumento da poluição, cenário que deixa o organismo mais suscetível às doenças virais e respiratórias, como a gripe e a pneumonia – logo há um aumento do risco cardiovascular. Isso porque a infecção causada pela gripe pode alterar a frequência cardíaca, sobrecarregando o bombeamento de sangue pelo coração.

 

Somado a isso, assim que o organismo detecta a presença de agentes infecciosos, passa a produzir substâncias para tentar reagir. O problema é que essas substâncias são inflamatórias e nocivas ao sistema cardiovascular. Elas acabam na corrente sanguínea e, se o paciente já tiver alguma vulnerabilidade cardíaca, o processo é mais rápido e grave, possivelmente resultando no infarto ou AVC.

 

Existe ainda a possibilidade de uma doença viral gerar um processo de agressão ao músculo do coração e provocar uma miocardiopatia, umas das causas mais comuns de insuficiência cardíaca (o coração não consegue bombear sangue suficiente para o resto do corpo) – quadro que pode igualmente culminar no ataque cardíaco ou acidente vascular cerebral.

 

Ressalvas

Contudo, é importante destacar que o frio por si só não deve ser considerado o único fator determinante para as complicações listadas. Outros aspectos do estilo de vida, como a regularidade da prática de atividades físicas, dieta alimentar, tabagismo e o controle da hipertensão, diabetes e colesterol, por exemplo, interferem e desempenham um papel crucial na saúde cardíaca geral.

 

Vale reforçar ainda que idosos, pessoas em situação de rua, cardiopatas e portadores da doença arterial coronária compõem um grupo com probabilidade mais elevada de enfrentar as consequências da exposição prolongada ao frio intenso.